O Pix, sistema de pagamento instantâneo brasileiro criado pelo Banco Central, completou nesta terça-feira (16/03) quatro meses de funcionamento com mais de 73 milhões de pessoas físicas e jurídicas cadastradas. O Pix baixou radicalmente o custo de transações eletrônicas entre pessoas, mas tem objetivos mais ambiciosos: promover a inclusão financeira ampla, reduzir a sonegação, aumentar a competitividade do setor e facilitar a vida das pessoas. Só que uma das maiores vantagens do Pix – o fato dos recursos serem transferidos em segundos de uma conta para outra, sem intermediários – também pode trazer dor de cabeça para os consumidores.

Na avaliação de Daniel Oliveira, CEO da paySmart, fintech que permite que qualquer empresa se torne um banco digital, algumas questões clássicas de proteção do consumidor, como o mecanismo de contestação de compras com cartões de crédito, podem fazer falta, sobretudo no comércio eletrônico. Ao comprar um bem ou serviço pela internet com o Pix, o consumidor precisa ficar atento porque nem sempre poderá reaver os valores pagos caso o produto não seja entregue.

“Os consumidores se acostumaram ao mecanismo conhecido como contestação ou disputa. Se a geladeira não chega no prazo estipulado, o consumidor pode cancelar a compra no cartão de crédito. Mas com a versão atual do Pix, o dinheiro está na conta do vendedor, imediatamente após a compra e não há muito o que se possa fazer”, explica o CEO da paySmart. Tal característica tem sido aproveitada por lojas fraudulentas, que normalmente oferecem produtos e serviços com preços muito abaixo do mercado por e-mail, mensagens de WhatsApp ou SMS.

“Antes, o objetivo deste tipo de ataque era roubar dados do cartão de crédito. A ideia, agora, é fazer com que o consumidor conclua o pagamento via Pix e, uma vez realizada a transação, o comprador não tem muito o que fazer a não ser procurar a justiça comum”, detalha Oliveira. Mesmo para o caso de sites de e-commerce verdadeiros, explica Daniel Oliveira, caso ocorra algum problema com a entrega, com a qualidade do produto ou ainda com a realização dos serviços contratados, o consumidor pode ter dificuldades para estornar a transação e ter o dinheiro de volta.

Em 2021, o Banco Central está planejando uma série de novas funcionalidades para o Pix, dentre elas o “Pix Cobrança”, que permitirá realizar cobranças agendadas similares a um boleto; o “Pix Agendado” que permitiria agendar uma transferência para uma data pré-estabelecida; e o “Pix Garantido”, uma espécie de caução, que bloquearia os valores na conta do remetente, mas que só faria a transferência posteriormente. Essas funcionalidades, juntamente com o “Pix Offline”, que permitiria ao pagador iniciar o pagamento mesmo estando temporariamente sem internet; o “Pix Saque”, para sacar dinheiro em espécie em caixas eletrônicos; e o “Pix por aproximação”, para fazer pagamentos em maquininhas por NFC, pretendem estender o sistema e resolver alguns problemas de usabilidade atuais.

“Enquanto esses mecanismos não estiverem disponíveis, entretanto, temos uma assimetria de risco entre o lojista e o consumidor quando comparamos o Pix com o cartão de crédito. Com o Pix, todo o risco de uma transação de comércio eletrônico está com o consumidor, enquanto que, com o cartão, há um balanço entre consumidor e estabelecimento – e a possibilidade da bandeira do cartão atuar como um árbitro ou fiel da balança em uma disputa”, explica Oliveira.

Outro problema que tem acontecido com frequência é a realização de pagamentos em duplicidade. Oliveira explica que, por uma instabilidade no sistema, ou problemas na conexão internet do usuário, não é incomum haver esse tipo de desacerto. Porém, reaver o dinheiro pago depende da boa vontade do vendedor ou prestador de serviço. No caso de empresas, processos internos, fluxos de documentos e autorizações podem fazer com que a devolução leve muitos dias.

De acordo com o Banco Central, de novembro de 2020 até o dia 28 de fevereiro deste ano, o Pix foi responsável por mais de 275 milhões de transações, movimentando mais de R$ 197 bilhões de reais – cerca de quatro transações por pessoa por mês.