As mulheres são maioria da população no Brasil. Segundo estatísticas publicadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)as mulheres estudam e tem vida mais longa do que em relação aos homens, além disso trabalham cada vez mais e nas mais diversas áreas. A pergunta é: Por que há poucas mulheres em um setor tão próspero como a tecnologia da informação (TI) que prevê um crescimento de 3% até 2022?

Em 2019, o programa YouthSpark, da Microsoft, apontou que no Brasil, o curso ciência da computação tinha somente 18% de graduadas, enquanto que 25% das empregadas em áreas técnicas de tecnologia da informação eram mulheres.

“Num mundo tradicionalmente masculino, quase 100% da gestão das áreas relacionadas a TI é provida por homens. Mas podemos pensar em questões como: qual é a dinâmica na maioria dos lares? Os meninos são privilegiados desde cedo com os games, com os computadores e todo tipo de brinquedo eletrônico, e ainda contam com o incentivo do pai ou até mesmo da mãe, para isso”, lembra Miriam Vasco, Presidente da Sucesu SP e Diretora da IPSense Tecnologia. E completa: “Veja a relação de meninos e meninas em cursos de Ciência da Computação, nas Universidades. é sem comparação!”.

Talvez o mal preparo nas escolas! A educação da maneira como é disposta enquanto a gradecurricular, os professores, temas, não apresenta a carreira as meninas. Não é uma formaçãointegrativa, social, e gradua as mulheres e homens para um mundo que não existe, ou não deveria mais existir: separatista, elitista e se afasta do conceito da educação para a vida além de replicar modelos antigos de convivência, reforçando estereótipos “, avalia Claudia Chamas, Analista de Governança de dados pleno na Keryus.

Além da barreira cultural, as mulheres que decidem seguir os estudos na área de tecnologia podem ainda encontrar outros desafios no mercado de trabalho: como salários inferiores e o descrédito por parceiros que não acreditam em seu potencial. Uma pesquisa da empresa de recrutamento a empresa Revelo indicou que as mulheres de TI recebem cerca de 17,4% menos que os homens.

“Quem dispõe em uma discussão de trabalho, é  quem tem mais experiência tanto profissional, quanto de graduação, mas quando os homens não tem isso, a discussão termina com: quem manda sou eu, e vocês obedecem, e infelizmente os homens são a maioria nos cargos de chefia”, lembra Claudia.

Outra pesquisa chamada Resetting Tech Culture, divulgada pela Accenture em parceria com a Girls Who Code,  organização sem fins lucrativos que visa apoiar e aumentar o número de mulheres na área de computação, trouxe resultados nada  animadores: metade das profissionais da área vão deixá-la antes de chegarem aos 35 anos, sendo a principal causa a cultura organizacional não inclusiva. Além disso, apurou que a participação feminina nas áreas vem declinando nas últimas três décadas. Acredita-se que essa queda ocorre também no Brasil.

Profissionais brasileiras da área tem percepções similares, conforme o estudo “Gestão de Tecnologia da Informação: preconceitos de gênero prejudicam a carreira de mulheres que atuam na área?”, desenvolvido por pessoal ligado à Universidade Presbiteriana Mackenzie e ao Centro Paula Souza.

“O estudo americano também conclui que se todas as empresas participantes tivessem posturas similares às adotadas pelas 20% que mais se preocupam com o assunto, seria possível ter 3 milhões de mulheres dessa faixa etária atuando na área de tecnologia em 2030, mais que o dobro das que estarão na área se as tendências atuais se confirmarem”, afirma  Vivaldo José Breternitz ,Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, é professor da Faculdade de Computação e Informática da Universidade Presbiteriana Mackenzie. “Cenário similar deve prevalecer no Brasil, o que é muito ruim para nossa sociedade e nossa economia”, completa.

Algumas iniciativas podem indicar o caminho

O Senac São Paulo, que oferece desde 2019 o Ensino Médio Técnico em Informática, realizou um levantamento sobre o ingresso de meninas no curso. Para entender ainda melhor como avançar no tema, ouviu de suas alunas como identificar os pontos que mais atraem a estudante para esta área.

“Eu como estudante de TI, percebo a diferença no número de meninas e meninos que formam a minha sala de aula e diante disso eu espero que tenha igualdade. Que as mulheres não desistam de fazer algo só porque a sociedade classifica como trabalho para homens, que nós sejamos livres para seguirmos a profissão que quisermos, nosso lugar não é só em salão de beleza, em hospitais sendo enfermeira, nosso lugar é onde quisermos estar”, relata Larissa Rodrigues, estudante do Ensino Médio Técnico em Informática do Senac São Paulo.

A instituição promoveu o levantamento Gênero em TI, que demonstrou que no Ensino Médio Técnico em Informática do Senac São Paulo, 34% das alunas são meninas, proporção maior do que outros cursos da instituição. “Consideramos que levar a formação técnica e profissional em Informática para uma proposta integrada ao Ensino Médio, no nível da educação básica, amplia a chance de mais mulheres se interessarem por uma carreira profissional na área de TI”, aponta Melina Sanjar, gerente de desenvolvimento e responsável pelo Ensino Médio Técnico do Senac São Paulo.

E esse interesse tem gerado iniciativas. No ano passado, Larissa desenvolveu com as amigas, o site “Empoderadas da T.I.”, que deu aulas de Excel para mulheres. “Esse ano, estamos com uma proposta de produzir acessórios como brincos, colares e pulseiras, conectados a redes de computadores. Assim as mulheres que estiverem usando poderão acionar caso se sintam em risco. Nossa proposta é fazer isso por meio de um minicurso”, completa a aluna.

Miriam Vasco também vê com entusiasmo as mulheres em posições estratégicas. “Temos esperança no crescimento do número de mulheres na TI, não por qualquer tipo de defesa ao feminismo, mas por uma simples igualdade de ser humano para ser humano – ou – por Ser Humano, sem distinção de gênero, cor, raça, classe ou religião. Porém, tem muito a se fazer, ainda”, lembra.

Mirian é fundadora, junto com amigas, de um grupo de Executivas de TI, desde 2008 que se chama NEXTi e VP do DNS-Women (grupo de mulheres da da ICANN), e a ideia é capacitar meninas da periferia em TI. “Nosso lema: ‘Dê um Salto de Patamar na Vida: com TI’. Temos alguns cases, exemplo uma menina da ETEC Pirituba, a Rubia, filha de uma empregada domestica e um motorista de taxi, que ajudamos a ir para Yale, e hoje ela faz INSPER, mudou de vida. Fazemos mentoria com ela até hoje”, recorda.

Na próxima década, e ainda mais levando-se em conta o “efeito Coronavírus” em todo o mundo, o papel da tecnologia será ainda mais importante. Sociedade, economia, educação, saúde e segurança dependerão cada vez mais dela. Programas, softwares e plataformas digitais serão desenvolvidos para todos, mas não seria o mais correto todos estarem envolvidos na sua inteligência e produção?

Como dito, as mulheres representam mais da metade da população no mundo, então é lógico que representem mais da metade da força de trabalho na área de tecnologia da informação. Já passou do momento de garantir que a igualdade de gênero exista para o bem de todos, e isso significa cada vez mais mulheres em cargos de liderança e mais incentivos para meninas seguirem os estudos e carreira em tudo o que estejam interessadas.

Agradecimentos: Claudia Chamas, Miriam Vasco, InPress Porter Novelli, Senac São Paulo e Assessoria de Imprensa do Instituto Presbiteriano Mackenzie

Publicado originalmente na Revista ABEINFO nº 3.